Conta que em sua última encarnação ele foi um rico barão,viveu em Santos.
Aos 40 anos, foi a Portugal procurar uma esposa, que tinha 14 anos;
casou-se com ela.
Em sua noite de núpcias, a moça não sangrou como ele esperava. Porém ele
sabia que ela era virgem.
Contudo, ficou furioso com isso. Armou uma cilada pra ela, dizendo que ela
tinha o traído.
Então ela fugiu com índios, sendo que ele para procura-la chegou a matar
quase uma tribo inteira.
Quando ele a encontrou, ela tinha um filho dele.
Voltou a ficar com ela, depois de um tempo, o filho dele morreu.
Não demorando muito tempo, tiveram outro filho, que teve o mesmo destino do
outro, falecendo depois de alguns anos.
Ele com remorso, contou a história para sua esposa do que ele tinha armado;
ela novamente o largou.
Ele, doente, foi morrendo aos poucos em cima de uma cama; não comia, não
tinha força sequer para se levantar.
Morreu aos poucos...
Do livro
Guardião da Meia
Noite
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Conheça-te a ti mesmo
Congá firmado,
corrente mediúnica a postos e na consulência consulentes pegavam suas senhas e
se acomodavam como podiam, pois toda última sexta feira do mês é sempre assim,
gira de Exu e o terreiro enche tanto que muitos ficam de pé e formam fila até o
portão. Na expectativa de milagres fáceis ou mesmo por achar que exu seja
uma espécie de “Office-boy do além”, muitos recorrem aos terreiros solicitando
soluções emergenciais às suas tormentas. O dirigente abre a gira e após todo
ritual pertinente os exus e pomba giras incorporam nos médiuns e aguardam o
atendimento que acontece adiante... - Salve tu moça! - O ... oi...
Bo...boa noite... - Boa noite moça, é sua primeira vez por estas bandas?
- Sim. - Seja bem vinda. - Obrigada! - O que lhe traz aqui?,
- Então Exu, é que meu irmão precisa separar da noiva... - ... -
Pois é, ela só faz inferno na minha vida e sei que ele não é feliz, ele
abandonou a família, eu moro com ele e ela está tirando-o do seio familiar...
- ... - Bem, pensando nisso é que trouxe o RG dele, uma foto dela, uma
roupa dela e endereço dele... - “Mais uma serpente revestida de santa” –
meditou o exu. - Então Exu? O que fará para livra-lo desta piranha? Esta
afirmação bastou para que o Exu se manifestasse. - Certo moça vamos ler o
que vejo aqui, primeiro saiba que esta mulher que está com seu irmão o ama
verdadeiramente sendo igualmente correspondida, ele jamais imaginou viver
tamanho sentimento e nela encontrou o sentido de liberdade e crescimento.
Liberdade porque finalmente se livrará de você, uma mulher encalhada e
ressequida no coração, que não acredita no amor, não se movimenta para mudar sua
realidade, vive do dinheiro que ele lhe dá e acomodada com esta vidinha e medo
de perder tudo isto, sente-se no direito de ter o seu irmão como posse para que
nada mude na sua vida a ponto de se propor a encomendar um “feitiço” para
desgraçar a vida dele e por fim amarra-lo em você. - Moça, esta é
sinceramente uma das situações mais inusitadas que vivencio, uma irmã querendo
amarrar o irmão, enquanto que o normal seria uma apaixonada querendo prender o
apaixonado. Pior é este sentimento que te move, covarde e inescrupuloso... A
mulher já em prantos, reconhecendo o erro que cometera não consegue pronunciar
uma palavra ao que o exu finaliza. - Sendo assim, pegue esta roupa, fotos e
demais elementos, volte pra sua casa, olhe no espelho e se envergonhe de ser o
que está sendo, se proponha a mudar e trate bem esta mulher que será a
companheira do seu irmão, tenha nela sua amiga que jamais irá te desamparar,
antes de dormir ore ao Criador pedindo perdão por envergonha-lo. - Desculpe
Exu.... - Leve esta vela, acenda quando sentir vontade e lembre-se que neste
dia se deparou com um Exu...tenha uma boa noite... - Desculpe Exu...
Pois é leitor, estas situações são mais comuns do que parecem. Acredite,
esta é uma história verídica e bem resumida que narra o egoísmo humano, a
covardia e o julgo inversor de valores. Por vezes nos deparamos com situações
que não nos pertencem, avaliamos atitudes, alegrias, tristezas e decisões das
pessoas no nosso convívio sem que sejamos interpelados para isso, tomamos em
nossas mãos o papel de juiz da vida alheia, promotor e executor de tudo aquilo
que não nos compete. Não vou me ater em delongas e proponho a você leitor,
por algum momento se sentiu na história? Sobre quem e o que falaste nos últimos
dias? Você fala ou escuta mais? Responda sinceramente estas questões e ao se
olhar no espelho lembre-se da frase tão preconizada pelo pensador Sócrates:
- Conheça-te a ti mesmo. Perceba como deve agir e seja feliz.
Rodrigo Queiroz
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LENDA DE (UM) EXU CAVEIRA
Sou exu, assentado nas forças do Sagrado Omulu e sob sua irradiação divina
trabalho. Fui aceito pelo Divino Trono e nomeado Exu a mais ou menos dois
milênios, depois de minha última passagem pela terra, a qual fui um pecador
miserável e desencarnei amarrado ao ódio, buscando a vingança, dando vazas ao
meu egoísmo, vaidade e todos os demais vícios humanos que se possa imaginar.
Fui senhor de um povoado que habitava a beira do grande rio sagrado. Nossa
aldeia cultuava a natureza e inocentemente fazia oferendas cruéis de animais e
fetos humanos. Até que minha própria mulher engravidou e o sumo sacerdote,
decidiu que a semente que crescia no ventre de minha amada, devia ser
sacrificado, para acalmar o deus da tempestade. Obviamente eu não permiti que
tal infortúnio se abatesse sobre minha futura família, até porque se tratava do
meu primeiro filho. Mas todo o meu esforço foi em vão. Em uma noite tempestuosa,
os homens da aldeia reunidos, invadiram minha tenda silenciosamente, roubaram
minha mulher e a violentaram, provocando imediato aborto e com o feto fizeram a
inútil oferenda no poço dos sacrifícios. Meu peito se encheu de ódio e eu nada
fiz para conte-lo. Simplesmente e enquanto houve vida em mim, eu matei um por um
dos algozes de minha esposa inclusive o tal sacerdote. Passei a não crer
mais em deuses, pois o sacrifício foi inútil. Tanto que meu povoado sumiu da
face da terra, soterrado pela areia, tamanha foi a fúria da tempestade.
Derrepente o que era rio virou areia e o que areia virou rio. Mas meu ódio
persistia. Em meus olhos havia sangue e tudo o que eu queria era sangue. Sem
perceber estava sendo espiritualmente influenciado pelos homens que matei, que
se organizaram em uma trevosa falange a fim de me ver morto também. O sacerdote
era o líder. Passei então a ser vítima do ódio que semeei. Sem morada e sem
rumo, mas com um tenebroso exército de homens odiosos, avançamos contra várias
aldeias e povoados, aniquilando vidas inocentes e temerosamente assombrando todo
o Egito antigo. Assim invadimos terras e mais terras, manchamos as sagradas
águas do Nilo de sangue, bebíamos e nos entregávamos às depravações com todas as
mulheres que capturávamos. Foi uma aventura horrível. Quanto mais ódio eu tinha,
mais eu queria ter. Se eu não podia ter minha mulher, então que nenhum homem em
parte alguma poderia ter. Entreguei-me a outros homens, mas ao mesmo tempo
violentava bruscamente as mulheres. As crianças, lamentavelmente nós matávamos
sem piedade. Nosso rastro era de ódio e destruição completas. Até que chegamos
aos palácios de um majestoso faraó, que também despertava muito ódio em alguns
dos mais interessados em destruí-lo, pois os mesmos não concordavam com sua
doutrina ou religião. Eis que então fomos pagos para fazer o que tínhamos prazer
em fazer, matar o faraó. Foi decretada então a minha morte. Os fiéis
soldados do palácio, que eram muito numerosos, nos aniquilaram com a mesma
impiedade que tínhamos para com os outros. Quem com ferro fere, com ferro será
ferido. Isto coube na medida exata para conosco. Parti para o inferno. Mas
não falo do inferno ao qual os leitores estão acostumados a ouvir nas lendas das
religiões efêmeras que pregam por aí. O inferno a que me refiro é o inferno da
própria consciência. Este sim é implacável. Vendo meu corpo inerte, atingido
pelo golpe de uma espada, e sangrando, não consegui compreender o que estava
acontecendo. Mas o sangue que jorrava me fez recordar-me de todas as minhas
atrocidades. Olhei todo o espaço ao meu redor e tudo o que vi foram pessoas
mortas. Tudo se transformou derrepente. Todos os espaços eram preenchidos com
corpos imundos e fétidos, caveiras e mais caveiras se aproximavam e se
afastavam. Naquele êxtase, cai derrotado. Não sei quanto tempo fiquei ali,
inerte e chorando, vendo todo aquele horror. Tudo era sangue, um fogo
terrível ardia em mim e isso era ainda mais cruel. Minha consciência se fechou
em si mesma. O medo se apossou de mim, já não era mais eu, mas sim o peso de
meus erros que me condenava. Nada eu podia fazer. As gargalhadas vinham de fora
e atingiam meus sentidos bem lá no fundo. O medo aumentava e eu chorava cada vez
mais. Lá estava eu, absolutamente derrotado por mim mesmo, pelo meu ódio cada
vez mais sem sentido. Onde estava o amor com que eu construí meu povoado? Onde
estavam meus companheiros? Minha querida esposa? Todos me abandonaram. Nada mais
havia a não ser choro e ranger de dentes. Reduzi-me a um verme, jogado nas
trevas de minha própria consciência e somente quem tem a outorga para entrar
nesta escuridão é que pode avaliar o que estou dizendo, porque é indescritível.
Recordar de tudo isto hoje já não me traz mais dor alguma, pois muito eu aprendi
deste episódio triste de minha vida espiritual. Por longos anos eu vaguei
nesta imensidão escura, pisoteado pelos meus inimigos, até o fim das minhas
forças. Já não havia mais suspiro, nem lágrimas, nem ódio, nem amor, enfim nada
que se pudesse sentir. Fui esgotado até a última gota de sangue, tornei-me um
verme. E na minha condição de verme, eu consegui num último arroubo de minha vil
consciência pedir socorro a alguém que pudesse me ajudar. Eis que então, depois
de muito clamar, surgiu um alguém que veio a tirar-me dali, mesmo assim
arrastado. Recordo-me que estava atado a um cavalo enorme e negro e o cavaleiro
que o montava assemelhava-se a um guerreiro, não menos cruel do que fui.
Depois de longa jornada, fui alojado sobre uma pedra. Ali me alimentaram e
cuidaram de mim com desvelo incompreensível. Será que ouviram meus apelos?
Perguntava-me intimamente. Sim claro, senão ainda estaria lá naquele
inferno, respondia-me a mim mesmo. Cale-se e aproveite o alvitre que vosso pai
vos concedeu. - Disse uma voz vinda não sei de onde. O que eu não compreendi foi
como ele havia me ouvido, já que eu não disse palavra alguma, apenas pensei, mas
ele ouviu. Calei-me por completo. Por longos e longos anos fiquei naquela
pedra, semelhante a um leito, até que meu "corpo" se refez e eu pude levantar-me
novamente. Apresentou-se então o meu salvador. Um nobre cavaleiro, armado até os
dentes. Carregava um enorme tridente cravado de rubis flamejantes. Seu porte era
enorme. Longa capa negra lhe cobria o dorso, mas eu não consegui ver seu rosto.
Não tente me olhar imbecil, o dia que te veres, verás a mim, porque aqui todos
somos iguais. Disse o homem em tom severo. Meu corpo tremia e eu não
conseguia conter, minha voz não saia e eu olhava baixo, resignando-me perante
suas ordens. - Fui ordenado a conduzir-lhe e tenho-te como escravo. Deves me
obedecer se não quiser retornar àquele antro de loucos que estavas. Siga minhas
instruções com atenção e eu lhe darei trabalho e comida. Desobedeça e sofrerás o
castigo merecido. - Posso saber seu nome, nobre senhor? - Por enquanto
não, no tempo certo eu revelarei, agora cale-se, vamos ao nosso primeiro
trabalho. - Esta bem. Segui o homem. Ele a cavalo e eu corria atrás dele,
como um serviçal. Vagamos por aqueles lugares sujos e realizamos várias tarefas
juntos. Aprendi a manusear as armas, que me foram dadas depois de muito tempo.
Aos poucos meu amor pela criação foi renascendo. As várias lições que me foram
passadas me faziam perceber a importância daqueles trabalhos no astral inferior.
Gradativamente fui galgando os degraus daquele mistério com fidelidade e
carinho. Ganhei a confiança de meu chefe e de seus superiores. Fui posto a
prova e fui aprovado. Logo aprendi a volitar e plasmar as coisas que queria.
Foram anos e anos de aprendizado. Não sei contar o tempo da terra, mas asseguro
que menos de cem anos não foram. Foi então que numa assembléia repleta de
homens iguais ao meu chefe, eu fui oficialmente nomeado Exu. Nela eu me
apresentei ao Senhor Omulu e ao divino trono, assumindo as responsabilidades que
todo Exu deve assumir se quiser ser exu. - Amor a Deus e às suas leis; -
Amor à criação do Pai e a todas as suas criaturas; - Fidelidade acima de
tudo; - Compreensão e estudo, para julgar com a devida sabedoria; -
Obedecer às regras do embaixo, assim como as do encima; E algumas outras
regras que não me foi permitido citar, dada a importância que elas têm para
todos os Exus. A principio trabalhei na falange de meu chefe, por gratidão e
simpatia. Mas logo surgiu-me a necessidade de ter minha própria falange, visto
que os escravos que capturei já eram em grande número. Por esta mesma época,
aquele antigo sacerdote, do meu povoado, lembram-se? Pois é, ele reencarnou em
terras africanas e minha esposa deveria ser a esposa dele, para que a lei se
cumprisse. Vendo o panorama do quadro que se formou, solicitei imediatamente uma
audiência com o Divino Omulu e com O Senhor Ogum – Megê e pedi que intercedessem
para que eu pudesse ser o guardião de meu antigo algoz. Meu pedido foi atendido.
Se eu fosse bem sucedido poderia ter a minha falange. Assim assumi a esquerda do
sacerdote, que, na aldeia em que nasceu, foi preparado desde menino para ser o
Babalorixá, em substituição ao seu pai de sangue. A filha do babalao era minha
ex-esposa e estava prometida ao seu antigo algoz. Assim se desenvolveu a trama
que pôs fim às nossas diferenças. Minha ex-mulher deu a luz a vinte e quatro
filhos e todos eles foram criados com o devido cuidado. Muito trabalho eu tive
naquela aldeia. Até que as invasões e as capturas e o comércio de negros para o
ocidente se fizeram. Os trabalhos redobraram, pois tínhamos que conter toda a
revolta e ódio que emanava dos escravos africanos, presos aos porões dos navios
negreiros. Mas meu protegido já estava velho e foi poupado, porém seus
filhos não, todos foram escravizados. Mas era a lei e ela deveria ser cumprida.
Depois de muito tempo uma ordem veio do encima: Todos os guardiões devem se
preparar, novos assentamentos serão necessários, uma nova religião iria nascer,
o que para nós era em breve, pois não sei se perceberam, mas o tempo espiritual
é diferente do tempo material. Preparamo-nos, conforme nos foi ordenado. Até que
a Sagrada Umbanda foi inaugurada. Então eu fui nomeado Guardião à esquerda do
Sagrado Omulu e então pude assumir minha falange, meu grau e meus degraus.
Novamente assumi a obrigação de conduzir meu antigo algoz, que hoje já está no
encima, feito meritóriamente alcançado, devido a todos os trabalhos e
sacrifícios feitos em favor da Umbanda e do bem. Hoje, aqui no embaixo,
comando umaa falange dos Exus Caveira e somente após muitos e muitos anos eu
pude ver minha face em um espelho e notei que ela é igual à de meu tutor querido
o Grande Senhor Exu Tatá Caveira, ao qual devo muito respeito e carinho. Não
confundam Exu Caveira, com Exu Tatá Caveira, os trabalhos são semelhantes, mas
os mistérios são diferentes. Tatá Caveira trabalha nos sete campos da fé; Exu
caveira trabalha nos mistérios da geração na calunga, porque é lá que a vida se
transforma, dando lugar à geração de outras vidas. Onde há infidelidade ou
desrespeito para com a geração da vida ou aos seus semelhantes, Exu Caveira
atua, desvitalizando e conduzindo no caminho correto, para que não caiam nas
presas doloridas e impiedosas, pois não desejo a ninguém um décimo do que
passei. Se vossos atos forem bons e louváveis perante a geração e ao Pai Maior,
então vitalizamos e damos forma a todos os desejos de qualquer um que queira
usufruir dos benefícios dos meus mistérios. De qualquer maneira, o amor impera,
sim o amor, e por que Exu não pode falar de amor? Ora se foi pelo amor que todo
Exu foi salvo, então o amor é bom e o respeito a ele conserva-nos no caminho.
Este é o meu mistério. Em qualquer lugar da calunga, pratique com amor e
respeito a sua religião, pois Exu Caveira abomina traição e infidelidade, como,
por exemplo, o aborto, isto não é tolerado por mim e todos os que praticam tal
ato é então condenado a viver sob as hostes severas de meu mistério. Peça o
que quiser com fé, e com fé lhes trarei, pois todos os Exus Caveira são fiéis
aos seus médiuns e àqueles que nos procuram. A falange de Exus Caveira
pertence à falange do Grande Tatá Caveira, os demais não posso citar, falo
apenas do meu mistério, pois dele eu tenho conhecimento e licença para abrir o
que acho necessário e básico para o vosso aprendizado, quanto ao mais, busquem
com vossos Exus pessoais, que são grandes amigos de seus filhos e certamente
saberão orientar com carinho sobre vossas dúvidas. Mais a mais, se um Exu de
minha falange consegue vencer através de seu médium ou protegido, ele
automaticamente alcança o direito de sair do embaixo e galgar os degraus da
evolução em outras esferas. Que o Divino Pai maior possa lhes abençoar e que
a Lei Maior e a Justiça Divina lhes dêem as bênçãos de dias melhores. Com
carinho Exu Caveira.
José Augusto
Barboza.
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Lenda de um Exú
Marabo
EXÚ MARABÔ DA FIM A CARREIRA DO KIUMBA E SEU CAVALO! ***
Exu Marabô está em terra. Os poucos filhos que acompanham aquele terreiro
vibram com sua presença. Na assistência algumas pessoas ansiosas aguardam para
serem atendidas. O Exú ri, dança, bebe desenfreadamente. Atende uma filha da
casa recém-casada. Fala para a filha tomar cuidado com o marido, pois ele vai
traí-la em breve. A moça desespera-se. Ele então passa uma longa lista para
realizar o trabalho salvador. Sabe que já plantou a semente irreversível da
desconfiança no jovem casal. Na assistência um pequeno empresário aguarda
atendimento. O Exú diz que a firma não falirá, para isso precisa de vultuosa
quantia em dinheiro para trabalho urgente. Chega a vez de uma médium, filha de
outro terreiro, que visita pela primeira vez a casa. Mais uma vez o compadre não
se faz de rogado. Diz para a pequena sair do terreiro que freqüenta, pois
segundo ele a mãe de santo não entende nada sobre Umbanda. E assim ele vai
plantando a discórdia, a desunião, a dor. Sempre que pode humilha
publicamente os filhos da casa. Os dias passam sem novidades. O que
ninguém ali imagina é que por trás daquela entidade que se diz chamar Marabô,
está escondido um enorme quiúmba. Aproveitando-se do fato do tal pai de santo
ser pessoa leiga, gananciosa e totalmente despreparado, ele domina o mental do
incauto médium. Diverte-se com a angústia dos outros. Sempre que pode põe o pai
de santo em enrascadas (cheques sem fundos, golpes que são descobertos
constantemente, brigas e desunião em família). E o pai de santo não tem
escrúpulos algum em usar o nome de um grande e respeitado Exú de Lei. Ao
contrário, fica feliz em saber que aos poucos vai minando a credibilidade do
verdadeiro Marabô. O Exú raciocina que o dia em que as trapalhadas colocarão
tudo a perder e ele simplesmente abandonará o falso pai de santo à própria
sorte. Não será o primeiro nem o último que ele abandonará. Afinal pensa o
quiúmba, não fora ele que médium ainda novo, desenvolvendo, resolveu mistificar
para dar uma abreviada no processo mediúnico de desenvolvimento? Não fora também
por conta própria que o médium abandonara o terreiro de sua mãe de santo, sem
ter preparo algum? Sem falar que enquanto esteve lá, desrespeitava os
ensinamentos da casa, zombava dos irmãos de santo, dava golpes em tantos médiuns
que muitos pediram até sua expulsão da casa? Pois então fora ele mesmo que
atraiu o quiúmba e sendo assim essa sociedade duraria até quando fosse possível.
O ser do umbral ganhando energia negativa, achincalhando Marabô, e o falso
pai de santo ganhando dinheiro. O quiúmba também aproveitava para trazer em
terra seus falangeiros, que se aproveitam dos médiuns titubeantes da casa.
Hoje é dia de gira, no atabaque o atabaqueiro já está devidamente bêbado e
sob influência dos asseclas do quiúmba. As filhas e filhos da casa cegos em sua
fé e sob forte energia maléfica, são capazes de aceitar qualquer loucura ali
realizadas. O falso Marabô está feliz, já olhou a assistência antes de
incorporar. Notou algumas pessoas que não lhe despertaram interesse.
Algumas mulheres velhas e sem dinheiro, um homem que também não traz
dinheiro algum. Vai se divertir com eles. Pronto já está em terra! Atende a
assistência como de costume, diverte-se com as angústias, os medos, as dores
daquelas pobres almas. Chega a vez do homem que estava na assistência, ele
adentra de maneira lenta. O quiúmba não lhe dá a mínima atenção. Um erro
fatal. Pois assim que o homem fica frente a frente com o ser do umbral algo
inusitado acontece: o homem incorpora, solta uma gargalhada jovial e
desafiadora. Alguns médiuns do terreiro que mistificavam ou recebiam alguns
asseclas do quiúmba “desincorporam” convenientemente. O atabaqueiro de tão
bêbado, acaba por cair ao lado do tambor. A assistência não entende o que se
passa. O quiúmba entende, mas para ele é tarde demais. Por estar
incorporado ele não tem tanta desenvoltura como gostaria nesse momento crucial.
Está só, já que os covardes que o seguiam fugiram dali. Um verdadeiro Marabô
está ali diante dele e avança em sua direção. No congá as velas começam a
queimar a cortina que protege o altar. Na cafua a pinga aquecida pelas velas
também se incendeia. A assistência percebe que algo muito errado está
acontecendo e fogem todos. Antes o verdadeiro Marabô se vira para eles e
mostra o quanto foram tolos em se deixar enganar. Fala que devem procurar ajuda,
mas em terreiros sérios aonde se pratica a caridade, o amor e a união. Mostra o
quanto foram usados. O quiúmba protesta, mas é inútil, a máscara já caiu.
Marabô não está só, sua falange e muitos Exús de Lei estão adentrando no
falso terreiro. O quiúmba é capturado e levado para o Reino de Exú, onde
pagará caro pela insolência. O falso pai de santo está entregue a própria
sorte. As chamas consomem o terreiro velozmente. Ao chegar as primeiras
viaturas do Corpo de Bombeiro o oficial de plantão presencia uma cena que jamais
esquecerá: no meio das chamas o pai de santo é tragado pelo fogo e desencarna
diante dos olhos do atônito bombeiro. Uma risada se faz ouvir. Marabô
gargalha satisfeito do outro lado. Apesar das chamas o bombeiro sente um frio
que lhe percorre a espinha. O terreiro e o "pai de santo" viram cinzas.
Justiça foi feita. Saravá Senhor Marabô!!!
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Mais uma lenda de (um) Exu Marabô
O reino estava desolado pela súbita doença que acometera a rainha. Dia após
dia, a soberana definhava sobre a cama e nada mais parecia haver que pudesse ser
feito para restituir-lhe a saúde. O rei, totalmente apaixonado pela mulher,
já tentara de tudo, gastara vultosas somas pagando longas viagens para os
médicos dos recantos mais longínquos e nenhum deles fora capaz sequer de
descobrir qual era a enfermidade que roubava a vida da jovem. Um dia,
sentado cabisbaixo na sala do trono, foi informado que havia um negro querendo
falar com ele sobre a doença fatídica que rondava o palácio. Apesar de
totalmente incrédulo quanto a novidades sobre o caso pediu que o trouxessem à
sua presença. Ficou impressionado com o porte do homem que se apresentou. Negro,
muito alto e forte, vestia trajes nada apropriados para uma audiência real,
apenas uma espécie de toalha negra envolta nos quadris e um colar de ossos de
animais ao pescoço. - Meu nome é Perostino majestade. E sei qual o mal atinge
nossa rainha. Leve-me até ela e a curarei. A dúvida envolveu o monarca em
pensamentos desordenados. Como um homem que tinha toda a aparência de um
feiticeiro ou rezador ou fosse lá o que fosse iria conseguir o que os mais
graduados médicos não conseguiram? Mas o desejo de ver sua amada curada foi
maior que o preconceito e o negro foi levado ao quarto real. Durante três dias e
três noites permaneceu no quarto pedindo ervas, pedras, animais e toda espécie
de materiais naturais. Todos no palácio julgavam isso uma loucura. Como o
rei podia expor sua mulher a um tratamento claramente rudimentar como aquele? No
entanto, no quarto dia, a rainha levantou-se e saiu a passear pelos gramados
como se nada houvesse acontecido. O casal ficou tão feliz pelo milagre
acontecido que fizeram de Perostino um homem rico e todos os casos de doença no
palácio a partir daí eram encaminhados a ele que a todos curava. Sua fama correu
pelo reino e o negro tornou-se uma espécie de amuleto para os reis. Logo
surgiram comentários que ele seria um primeiro ministro que agradaria a todos,
apesar de sua cor e origem, que ninguém conhecia. Ao tomar conhecimento
desse fato o rei indignou-se, ele tinha muita gratidão pelo homem, mas torná-lo
autoridade? Isso nunca! Chamou-o a sua presença e pediu que ele se retirasse
do palácio, pois já não era mais necessário ali. O ódio tomou conta da alma
de Perostino e imediatamente começou a arquitetar um plano. Disse humildemente
que iria embora, mas que gostaria de participar de um último jantar com a
família real. Contente por haver conseguido se livrar do incomodo, o rei
aceitou o trato e marcou o jantar para aquela mesma noite. Sem que ninguém
percebesse, Perostino colocou um veneno fortíssimo na comida que seria servida
e, durante o jantar, os reis caíram mortos sobre a mesa sob o olhar malévolo de
seu algoz. Sabendo que seu crime seria descoberto fugiu embrenhando-se nas
matas. Arrependeu-se muito quando caiu em si, mas seus últimos dias foram
pesados e duros pela dor da consciência que lhe pesava. Um ano depois dos
acontecimentos aqui narrados deixou o corpo carnal vitimado por uma doença que
lhe cobriu de feridas. Muitos anos foram necessários para que seu espírito
encontra-se o caminho a qual se dedica até hoje. Depois de muito aprendizado
foi encaminhado para uma das linhas de trabalho do Exu Marabô e até hoje, quando
em terra, aprecia as bebidas finas e o luxo ao qual foi acostumado naquele reino
distante. Tornou-se um espírito sério e compenetrado que a todos atende com
atenção e respeito. Saravá o Sr. Marabô!
Obs.: A Falange
do Exu Marabô é formada por inúmeros falangeiros que levam seu nome e esta é
apenas uma das muitas histórias que eles têm para nos
contar.
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UMA HISTÓRIA PARA VOCÊ
- De (um) Exu Sete Encruzilhada das Almas
A noite convidava à festa, Os sorrisos pairavam no
ar, Os olhos percorriam a Vida E as estrelas se faziam brilhar.
Tudo era alegria Naquele dia qualquer.... Eu havia lhe feito
promessas, Eu havia lhe dado presentes... Mas não contava que a
felicidade Tivesse um preço tão ardente!
A bela tentou me avisar,
Correndo pela ladeira... Mas, chegou tarde, a pobre, Pois já era
feita a colheita!
Foi nas quebradas da noite, Lá pras bandas do
Tuití...
As bebidas e as gargalhadas Criavam imagens berrantes
Quando o alvoroço chegou, Dando fim ao som da música Que naquele
instante parou!
O infeliz mau amado, Ferido no seu orgulho De
homem, de fera, de alma carente, Lançou-me na escuridão Feito um bicho
doente! O golpe a mim desferido Com punhal ainda pulsa E ainda
lembro da noite, Que mais sozinho fiquei, Olhando-me sem entender,
Meu corpo frio, escondido, Servindo de alimento Para os vermes,
apodrecer!
A tocaia do destino Cumpriu-se no seu ardor, Não sei
bem quem desferiu A primeira garrafada... Porém, caindo, cambaleando,
Ainda zonzo, entendi: - Eis-me a hora
derradeira, Eis que chega o meu fim!... Embora a dor me
pungisse o corpo, Queimando-me as entranhas, Ainda puder reter os olhos
Naquele pobre infeliz, Porém, mais pena senti de mim... - Deus do céu! O que eu fiz?! Ainda lembro do
olhar De um amigo assustado, O único a chorar o pranto Da minha
triste despedida, Que volto a encontrar no tempo, Feito Alma, minha
amiga!
A rua se fez deserta No morro do Tuití. Não se soube do
indigente Que ali teve seu fim!
Mas que engano tão irônico, Lá
estava eu a penar E nem mesmo outro infeliz, Que eu pudesse abraçar...
Fiquei na escuridão das trevas, O que chamam de Umbral, E não
sei por quanto tempo Eu paguei pelo meu mal!
Até que um dia, Deus
louvado, Uma luz se acendeu, Em meu caminho solitário, Uma alma
intercedeu!
Estendeu a sua mão, Num gesto protetor, Tirando-me
das trevas E me dando seu amor.
Ao anjo que me salvou Após
tantas preces pedidas, O meu feliz obrigado, A minha eterna amizade,
Adeus às trevas e ao medo, Bendigo, hoje, seu nome: Meu Amigo e Irmão Alfredo! Hoje na minha lida,
De ajudar e servir, Lição tiro da vida, Daquela que perdi...
Não fazer mal a si mesmo, Muito menos
ao seu irmão, Pois as contas se ajustam, Do outro lado do portão!
Faço versos no Astral, Como humilde versejador, Canto as
frases que repito Para quem vem perguntar, Pois hoje sou Exu pequenino
Na ânsia de ajudar, Seguindo o Pai Maior No seu gesto de amar!
E sou 7 Encruza por que jurei 7 mil vezes 7, perdoar A toda e
qualquer punhalada Que me venha magoar! E sou das Almas,. Pois uma
Alma sou, Num eterno caminhar, Em direção à Luz, Sob o manto de Pai
Oxalá
Sete Encruzilhadas das
Almas
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História de (um) Exú Morcego
Em um castelo, inteiramente de pedra, mal cuidado e isolado no meio de uma
floresta, típico daqueles pertencentes ao feudo europeu, vivia um homem branco e
corpulento, trajando uma surrada roupa, provavelmente antes pertencente a um
guarda-roupa fino. Percebia-se o desgaste causado pelo passar do tempo, pois
ainda carregava uma grossa e rica corrente de ouro de bom quilate, com um enorme
crucifixo do mesmo cobiçado material. Parecia viver na solidão, muito embora no
castelo vivessem vários serviçais. Na torre do castelo, as janelas foram
fechadas com pedra, e só pequenas frestas foram feitas no alto das paredes. A
luz não podia entrar. A torre não tinha paredes internas, formando uma enorme
sala, com pesada mesa de madeira tosca, tendo como iluminação dois castiçais de
um só vela cada. Ao lado da tênue luz das velas, livros se espalhavam sobre a
mesa, mostrando ser aquele homem um estudioso e que algo buscava na literatura.
De braços abertos, com um capuz preto cobrindo sua cabeça, emitia estranhos
e finos sons, tentando descobrir o segredo da conhecida Sagrada Arte. Pelas
frestas da torre, entravam e saiam voando vários morcegos com os quais ele
procurava inspiração e força para atingir sua conquista. Por quê? Não sei. A
idéia e as razões eram da estranha figura. Parecia um homem de fino trato,
transfigurado na fixação de atingir um poder que não lhe pertencia. Seu nome
era Guland, hoje, ele trabalha como Guardião do Vale dos Suicidas e já teve seu
corpo perispiritual muuuuuito deformado por suas sucessivas vidas interrompidas
das mais diversas formas, e exatamente por isso levei mais de 4 anos, com o
trabalho de sucessivas incorporações nas linhas de esquerda, entregas e rezas
para que ele perdesse seu aspecto deforme, quase animalesco e voltasse seu
aspecto humano. Gouland, este senhor alquimista tem muitos mistérios e segredos,
mas nenhum deles causaram tanta admiração e respeito quanto sua linhagem de
atuação, incorporado no terreiro como o querido mas temido Exu Morcego. Ele é um
exu nervoso , anti-social, não é muito de prosa mas quando faz algum tipo de
trabalho como ele mesmo diz "vai buscar voando " e sempre cumpre com o que
diz.
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O AMIGO
Sob um clarão de luz, caminhe adiante, com força e com vontade. Os percalços
da vida são jogados ao léu, para se superar a caminho do céu! A presença de um
amigo é tão bom de se sentir... eu te acompanho, eu te ajudo, é só você não
desistir! A presença dos guias e a confiança no que fazem é tão importante
quanto o ar que se respira. Basta apenas umas coisinhas, fé e confiança.
Compreensão no que acontece. Depois da tempestade vem a bonança. Nunca abaixe a
cabeça ou desanime no caminho, já contou quantos amigos tem? Tem eu e tem muitos
outros, Malandrinho... Me chamam de "Cláudio", mas sou um "Irmão de Jornada",
mais um espírito nas estradas da vida. Cada degrau, cada passada, é sempre uma
experiência a ser vivida. Sou o amigo dos idos passados. Temos dívidas um com o
outro, fora a grande amizade conquistada a duras penas, que não se esvai com
facilidade. Basta coragem e alegria para vivermos em harmonia. Persistência e
postura para subir lá nas Alturas. Depois olhar para baixo e ver quanta coisa
passamos juntos e unidos, formando uma bela amizade, num laço de fraternidade.
Quando pensava me conhecer de pouco, já te acompanhava a caminhada. A hora certa
nos fez um ao outro conhecer. Depois sem perceber, gostar, apreciar... com
defeitos e acertos, mesmo assim me ama, falar do meu modo de ser, que gosta e
não reclama. Bela é sua conduta, agradeço o amor por mim, pois na mesma luta,
subiremos sempre assim. Trabalho muito e por isso me alegro. Não se esqueça,
amigo, que mesmo no meio da festa, estou a trabalhar, ajudando a quem precisa
dessas águas se banhar, de um jeito ou de outro, da maneira que convém. Você me
ajuda a subir, a me elevar, pois então, tome-me como exemplo pra sua cabeça não
baixar. Se eu não quero parar, não vai ser você que vai estancar. Não viemos
aqui e agora para estacionar e sim nos elevarmos a quem nos guia e comanda!
Tomara, Deus, que eu possa te ajudar com essas pequenas palavras a ditar. Na
minha mais pura ignorância, espero mandar para você um momento de paz e alegria,
trazendo a você a harmonia interior desejada. Você me dá a chance de ser alguém
e se depender de mim, não vai parar na estrada sem luz. Pois graças a Jesus, a
oportunidade de felicidade em nossa jornada é dada a todos, sem deixar que a luz
que há vá embora! Amigo é palavra chave. Como essa você tem muitos aqui, não nos
deixe chupando o dedo, por simples medo. O medo e o escuro se supera. Caminhe
com luz e altivez, como um Caboclo de luz e elevação. Mais embaixo estou eu, lhe
cobrindo com as forças que tenho, para sua mais breve ascensão. Espero ter
ajudado... se você tem lágrimas nos olhos, também tenho. Isso é sinal que valeu
e confirma a união. Caminhe com Deus e a nossa jornada estará sempre livre e
iluminada pelo Cristo. Com amor de um amigo... Seu guardião Claudio
Psicografia enviada ao Pai Pequeno Julio, no ano de
1994
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A lenda de (um) Exú
Capa Preta
O ônibus estava lotado, eu não conseguia vê-la, mas sabia que
estava lá. Podia senti-la, captava sua angustia, sua indecisão, e acima de tudo
seu medo. Ela não estava só, alem de mim, vi outros que a acompanhavam. Eram de
outra faixa vibratória, pertenciam ao passado. Tentavam envolvê-la com uma
energia densa e pegajosa. Sempre que faziam isso ela ficava mais nervosa e
também mais decidida. Eu os via, mas eles não me notavam. à medida que o ônibus
avançava pelas ruas centrais mais e mais pessoas entravam. Todos apressados para
chegar em casa. O coletivo corria em direção a periferia da cidade. Ela esta lá,
meio deslocada, olhava com insistência um pedaço de papel. Ali em suas mãos o
endereço que segundo ela mudaria seu destino. Ato continuo ela toca a campainha,
o ônibus para, descemos... Aqueles que a acompanham, vibram, ela esta na
iminência de servir como instrumento na vingança que planejam há muito tempo.
Vibram com tanto ódio que ela enfureceu-se consigo mesma. Como se deixara
envolver por aquele rapaz? Tinha que resolver isso imediatamente e tratar de
seguir sua vida, sem que seus pais soubessem. Ela verifica o número anotado,
esta perto. Chega a uma casa humilde, como todas as outras ali no bairro. Toca a
campainha é atendida por uma senhora que executara o serviço. A mulher a analisa
rapidamente, já vira muitas iguais a ela, não tem tempo para conversa fiada.
Pede-lhe o dinheiro e manda que espere, pois existem duas mulheres na frente
dela. Ela senta-se e aguarda. Eu tenho que agir rápido. Vibro minha espada no
ar, e os seres trevosos que a acompanham estarrecem ante minha presença.
Fatalmente eles me notam,agora ou correm ou me enfrentam. Decidem sabiamente
pela primeira opção, saem da casa, mas ficam do lado de fora, tentando contatar
outros que podem vir ajudá-los. Aproveito para me aproximar dela. Envolvo-a com
minha capa, ela se acalma, por um instante, sugestionada por mim e titubeia. Já
não tem certeza se deve continuar. Eu vibro em seu mental para que saia dali vá
tomar um ar fresco lá fora. Ela me atende. Quando chega , ainda envolvida por
minha capa, torna-se invisível para os que a acompanham. Tenho que me
materializar. Ela assusta-se ao me ver, tenta gritar não consegue, tenta voltar
para dentro da casa, mas eu a impeço. Chamo-a pelo nome, digo-lhe que não deve
me temer, falo que venho em paz. Tenho uma missão: Evitar que ela faça o aborto.
Não deve impedir aquele espírito de vir ao mundo. Pouco importa se a concepção
fora fruto de uma aventura. Deve deixá-lo vir. Será um menino, veio do
passado para cumprir uma missão, ela não deve abortá-lo. Sei que seus pais não
aprovarão a gravidez, mas me comprometo a acalmá-los e fazê-los aceitar. Ela
chora, não entende como pode estar ouvindo aquilo. Falo com tanta firmeza que
ela quer saber quem sou. Digo-lhe que me chamam de Exu Capa Preta, sou um
guardião, protegerei o menino que ela carrega no ventre. Estarei ao lado dele a
vida toda, acompanhando-o, guiando-o e protegendo-o. Portanto ele não deve
temer. Chorando ela consente, avança para a rua, toma um ônibus e retorna para
casa. Protejo-a durante a gravidez, o menino nasce forte e saudável, cresce sem
sobressaltos como prometi. Sempre que acho conveniente deixo-o que me veja, aos
poucos vou me apresentando. Hoje ele esta feliz, acabara de completar 18
anos.Seus amigos comemoram a data festiva. Movido pela curiosidade o rapaz
resolve conhecer um terreiro de Umbanda. Estou ansioso, chegou meu grande dia!
Ele chega, senta na assistência. Lá dentro uma gira de Exu. Eu já me entendi com
o Exu chefe da casa, somos bem vindos. Quando ele entra para tomar um passe com
linda Pomba Gira eu tomo-lhe à frente e incorporo. Abraço a moça com carinho, já
nos conhecemos de longa data, fumo, bebo, canto. Daqui para frente haverei de
incorporar sempre que necessário. E assim foi. Ele desenvolveu, abriu seu
próprio terreiro, cumpre com amor e carinho sua missão. De minha parte não o
abandono nunca. Estou sempre disposto e feliz.
Salve Sr. Exu da Capa Preta
Por Cásso
Ribeiro
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Conversando sobre Exu
Dizem que Exu é homem sério, carrasco, espírito sem compaixão alguma.
Muitos falam que nem mesmo sentimento essas entidades têmMuitos temem Exu,
relacionando–o com o Diabo ou com algum dessesmonstros cavernosos que a mente
humana é capaz de criar.
Bem... dia desses, no campo santo de meu pai Omulu,
o cemitério, vialgo inusitado, que me fez pensar...
Um desses Exus Caveiras,
que apresentam essa forma plasmada comomeio de ligação à falange a que
pertencem, chorava sobre um túmulo. Discretamente, isso devo dizer. Afinal, os
Caveiras, em sua maioria,são de natureza recatada e introspectiva. Mas chorava
sim.
Engraçado pensar nessa situação, não é mesmo? Ele chorava peloserros do
passado, chorava por uma pessoa a que amava muito, mas quejá não tem mais por
perto. Claro, sabe que ninguém morre, mas asaudade e o remorso apertavam fundo
seu coração.
Isso acontece muito no plano espiritual, onde, muitas vezes, os
laços são rompidos, devido às diferenças vibratórias. Na verdade,eles não se
rompem, mas apenas se afrouxam um pouco...
Mas, voltando à nossa história,
fiquei pensando muito sobre aquela visão. Pensei que ninguém acreditaria em mim,
se eu contasseesse "causo" a alguém. Afinal, Exu é homem acima do bem e do mal,
Exu não tem sentimento, Exu não chora...
E para aqueles, então, que endeusam
"seu" Exu, pensando ser ele um grande guardião, espírito da mais alta elite
espiritual, espírito corajoso, sem medos, violento guerreiro das trevas. Acaba
que, na Umbanda, Exu assume um arquétipo, ou mito, tão supra–humano, que,muitas
vezes, deixa de ser apenas o mais humano da própria Umbanda.
Arquétipo esse,
diga–se de passagem, muito diferente do Orixá Exu, o arquétipo base para a
formação do que chamamos de Linha de Esquerda dentro do ritual de Umbanda.
É, eu acho que todo Exu chora. Assim como eu e você também. Todo mundo
chora, pois todos temos dores, remorsos e tristezas. Isso é humano. Mas,
voltando ao campo santo...
Logo depois vi outro Exu, vestindo uma longa capa
preta, aproximar-se do triste amigo Caveira. O que conversaram não sei, pois não
ouvie não estava apto a ler os seus pensamentos. Mas uma coisa é certa: os dois
saíram a gargalhar muito!
Engraçado... Como é que pode? Estava chorando até
agora e, de repente, sai rindo, de uma hora pra outra? - pensei, contrariado.
Fiquei alguns dias refletindo sobre isso e cheguei a uma conclusão.
A
principal característica de todo Exu é o seu bom–humor. Afinal,mesmo em
situações muito complicadas, eles sempre têm uma boa gargalhada para dar. Na
pior situação, mesmo que de forma sarcástica, eles se divertem. Eles podem
escrever certo por linhas tortas, errado por linhas retas, errado por linhas
tortas, ou sei lá mais o quê, mas uma coisa é certa: vão escrever gargalhando.
Admiro esse aspecto de Exu. Tem gente que, de tanto trabalhar com Exu,
torna–se sério, faz "cara de mau", vive reclamando da vida, além de tornar–se um
grande juiz.
A verdade é que nunca vi Exu reclamar de nada, nem julgar
ninguém. Pelo contrário, o que vejo é Exu nos ensinar a não reclamar da vida,
pois tem gente que passa por coisa muito pior e o faz com honra e ... bom–humor!
Vejo também que Exu não julga ninguém. Afinal, quem é ele, ou melhor, quem
somos nós para julgarmos alguém? Exu ensina que o que nós muito condenamos,
assim o fazemos porque isso nos incomoda. E sabe por quê? Porque tudo que
condenamos aparece em nós, antes de aparecer nos outros.
Por isso Exu não
gosta de falso pregador, que vive dizendo aos outros como devem agir, vive
dizendo o que é certo, vive alertando os outros contra a vaidade, vive julgando,
mas, no dia a dia, pouco aplica as regras que impõe para os outros. O mundo está
cheio deles. E Exu sorri quando encontra um desses. Mais para frente eles serão
engolidos por si mesmos. Pela própria sombra. Mas Exu não ri porque fica feliz
com isso. Muito pelo contrário. Ele até sente por aquela pessoa, mas já que não
dá pra fazer outra coisa, o melhor é sorrir mesmo, não é?
O certo é que a
linha de Exu nos coloca frente a frente com o inimigo! Mas aqui não estamos
falando de nenhum "kiumba", assediador ou obsessor, mas sim de nós mesmos. O que
eu já vi de médium perdendo a compostura quando "incorporado" com Exu, não é
brincadeira. Muitos colocam suas angústias para fora; outros, seus medos e
inseguranças; muitos, seus complexos de inferioridade. Tudo isso Exu permite,
para que a pessoa perceba o quanto é complicada e enrolada naquele sentido da
vida.
Mas dizem que o pior cego é aquele que não quer ver... E o que tem de
gente que não quer enxergar os próprios defeitos... Aí não resta outra opção
para Exu, a não ser sorrir e sorrir mesmo quando nós nos damos mal.
Mas,
ainda falando dos múltiplos aspectos contraditórios de Exu, pois ele é a
contradição em pessoa, devo relatar aqui mais uma experiência surpreendente
sobre a sua natureza.
Dia desses, depois de um "pesado trabalho de
esquerda", fiquei refletindo sobre algumas coisas. E sempre que faço isso, algo
estranho acontece.
Nesse trabalho, muitos kiumbas, espíritos assediadores,
obsessores, eguns, ou seja qual for o nome que queiram dar, foram recolhidos e
encaminhados pelas falanges de Exu que estavam presentes. Sabe como é... na
Umbanda, a gente não pega um livro pesado e começa a doutrinar os espíritos
"desregrados da seara bendita". A gente entra com a energia, com a mediunidade e
com os sentimentos bacanas, deixando o encaminhamento e a "doutrinação" desses
amigos mais revoltados nas mãos dos guias espirituais.
Esse trabalho foi
complicado. Muitos, na expressão popular, estavam "demandando o grupo", ou seja,
estavam perseguindo nosso grupo de trabalho e assistência espiritual, pois
tinham objetivos e finalidades diversas e opostas.
Ninguém tinha arriado um
ebó na encruzilhada contra a gente. Eram atuações vindas de inteligências
opostas ao trabalho proposto e atraídas pelas "brechas vibratórias" de nossos
próprios sentimentos e pensamentos.
Mas que na Umbanda ainda se pensa que
tudo de errado é culpa de algum ebó na encruzilhada, isso é verdade...
Bom,
o que sei é que, alguns dias depois, durante a noite, enquanto eu dormia, alguém
me levou até um estranho lugar. Eu estava projetado, desdobrado, desprendido do
corpo físico, ou qualquer outro nome que vocês queiram dar. Fenômeno esse muito
estudado por diversas culturas espiritualistas do mundo. Fenômeno esse muito
comum também dentro da Umbanda, mas pouco estudado. Afinal, muitos pensam que
Umbanda é "só incorporar" os guias e, de preferência, de forma inconsciente!
Sei, sei... Olha Exu gargalhando novamente!
Nesse local, muitos espíritos
eram levados até mim e eu projetava energias de cura para eles. Vi várias
pessoas projetadas no ambiente, inclusive gente muito próxima, do grupo. Alguns
um pouco conscientes, outros completamente inconscientes. Mas o importante era a
energia mais densa que vinha pelo cordão de prata e que auxiliava no tratamento
daqueles irmãos sofredores.
Por quanto tempo fiquei lá não sei, já que a
noção de tempo e espaço é muito diferente no plano astral. O que sei é que, em
um certo momento, um Exu, que tomava conta do ambiente, veio conversar comigo:
- Está vendo quanto espírito a gente tem "pego" daquelas reuniões que vocês
fazem? - perguntou ele.
- Nossa, quantos! Muito mais do que eu podia
imaginar.
- E isso não é nada, comparado aos milhares que chegam,
diariamente, "das muitas casas" dos guardiões da Umbanda, espalhadas pelo
Brasil.
- Puxa!, mas isso é sinal que o pessoal anda trabalhando bem, não é
mesmo?
- Hahahaha, mas você é um idiota mesmo, né? Desde quando fazer isso é
um bom trabalho? Milhares chegam, mas sabem quantos saem daqui? Poucos! A
maioria também para servir as falanges de Exu. O grande problema é que os
médiuns de Umbanda pouco ou nada cuidam dos que aqui ficam precisando de ajuda.
- Nossa missão aqui é transformar os antigos valores desses espíritos, mesmo
que seja através da dor. Mas, depois disso, muitos precisam ser curados,
tratados. E, dessa parte, os umbandistas não querem nem saber!
- Ah, eu
ainda pego o maldito que disseminou que Umbanda só serve para cortar magias
negras e resolver dificuldades materiais. Vocês adoram falar de amor e caridade,
mas quase ninguém se lembra de vir até aqui cuidar desses espíritos que vocês
mesmos mandam para cá.
- É que muitos não sabem como fazer isso, amigo! -
tentei eu defender os umbandistas.
- Claro que não sabem! Só se preocupam em
"cortar demandas", combater feitiços e destruir "demônios das trevas". Grandes
guerreiros! Mas nada fazem sem os vossos Exus, parecendo mais grandes bebês
chorões, querendo brincar de guerra!
- Lembre–se bem. Todos que a mão
esquerda derrubar terão de subir pela mão direita. Essa é a Lei. Comecem a se
conscientizar de que ninguém aqui gosta de ver o sofrimento alheio. Comecem a
ter uma visão mais ampla do universo espiritual e da forma como a Umbanda se
relaciona com ele.
- Dediquem–se mais a esses que são encaminhados nos
trabalhos espirituais. Orem por eles, façam uma vibração por eles, tratem–nos
com a luz das velas e do coração. Busquem conhecimento e uma forma de
auxiliá–los.
- Quero ver se amanhã, quando você não agüentar mais o chicote
e não tiver ninguém para lhe estender a mão, se você vai achar tão "glamoroso"
esse ciclo infernal de demandas, perseguições emagias negativas. Isso aqui é só
sujeira, ódio, desgraça e tristeza. Poucos têm coragem de pousar os olhos sobre
essas paragens sombrias.
- É, isso é verdade. Muitos falam, mas poucos
realmente conhecem a verdadeira situação do astral inferior, à qual a Umbanda e
toda a humanidade está ligada, não é mesmo?
- Hahaha, até que você não é tão
idiota! Olha, vou dar um jeito de você se lembrar dessa conversa toda ao
acordar. Veja se escreve isso para os seus amigos umbandistas! E pare de
reclamar da vida. Quer melhorar? Trabalhe mais!
- Está certo, seu Exu Ganga.
Só mais uma coisa. Um dia desses li num livro que Ganga é uma falange
relacionada ao "lixo". Mas você se apresenta como um negro e, a julgar por esses
facões nas suas mãos, acho que nada tem a ver com lixo...
- Lixo é esse
livro que você andou lendo! Ganga é uma corruptela do termo Nganga, do tronco
lingüístico bantu. Quer dizer "o mestre", aquele que domina algo. O termo foi
usado por muitos, desde sacerdotes até mestres na arte da caça, da guerra, da
magia, etc. Algo parecido com o Kimbanda, mas esse mais relacionado diretamenteà
cura e à prática de Mbanda. A linha de Exus Ganga é formada por antigos
sacerdotes e guerreiros negros. É isso! Veja se queima a porcaria do livro onde
você leu essa besteira de "lixo"...
Pouca coisa lembro depois disso.
Despertei no corpo físico, era madrugada e não fui dormir mais.
Agora
estou acabando de escrever esse texto, onde juntei duas experiências sobre os
Exus. Não sei porque fiz isso, talvez pelo caráter desmitificador da sua figura.
Para falar a verdade, essas duas histórias são bem diferentes.
Primeiro
um Exu que chora, sorri e ensina o bom–humor, o autoconhecimento e o não
julgamento. Depois um Exu que se preocupacom o pessoal "lá de baixo".
Diferente, principalmente daquilo que estamos acostumados a
ouvir dentro do meio umbandista. Talvez Exu esteja mudando. Talvez nós, médiuns
e umbandistas, estejamos mudando. Talvez a Umbanda esteja mudando.
Ou, quem
sabe, a Umbanda e os Exus sempre foram assim, nós é que não compreendemos
direito aquilo que está muito perto de nós, mas, ao mesmo tempo, é tão
diferente.
Dizem que o pior cego é aquele que não quer ver...
(Fernando Sepe)
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LENDA - ORIXÁ EXUComo todos sabem exu sempre foi ranzinza e
encrenqueiro, adorava provocar confusões e fazia brincadeiras que deixavam a
todos confusos e irritados. Certa manhã acordou desalentado, afinal quem era
ele? Não fazia nada, não tinha poder algum, perambulava pelo mundo sem ter
qualquer motivação. Isso não estava correto. Todos os orixás trabalhavam muito e
tinham seus campos de atuação bem definidos e para ele nada fora reservado. Essa
injustiça ele não iria tolerar. Arrumou um pequeno alforje e colocou o pé no
mundo. Iria até o Orun exigir explicações. Depois de muito andar, finalmente
chegou ao palácio de Olorun. Tudo fechado. Dirigiu-se aos guardas do portão e
exigiu uma audiência com o soberano. Eles riram muito. Quem era aquele infeliz
para vir ali e exigir qualquer coisa. Exu ficou enfurecido nem os guardas
daquela porcaria de palácio o respeitavam. Passou então a gritar impropérios
contra o grande criador. Imediatamente foi preso e jogado em uma cela onde ficou
imaginando como sair daquela situação. Já estava arrependido de ter vindo, mas
não daria o braço a torcer. Iniciou novamente a gritaria e tanto barulho fez que
Olorun decidisse falar com ele. Exu explicou o que o trazia ali, falou da
injustiça que se achava vitima e exigiu uma compensação. Pacientemente o pai da
criação explicou que todos os orixás eram sérios e compenetrados, mas que ele,
Exu, só queria saber de confusões e brincadeiras. Então como ousava tentar se
igualar aos companheiros? Que fosse embora e não o aborrecesse mais. Era assim?
Não prestava para nada? Era guerra? Resolveu fazer o que mais sabia. Comer!
Todos sabiam de sua fome incontrolável desde o nascimento. Desceu do Orun e
começou a atacar os reinos dos orixás. Comeu as matas de Oxóssi. Bebeu os rios
de Oxum. Palitou os dentes com os raios de Xangô. O mar de Iemanjá era muito
grande e ele foi bebendo aos poucos. A terra tornou-se árida e prestes a acabar.
Por conta disso todos os orixás correram ao palácio em completo desespero. Exu
imediatamente foi preso e arrastado novamente até o Orun, desta vez, porém,
sentia-se vitorioso. Exigiu ser tratado com respeito e assumir um lugar no
panteão divino. Se assim não fosse, nada devolveria e comeria o restante do
mundo. Foi feita então uma reunião para se resolver o grande problema. Olorun
não poderia julgar sozinho, todos que ali estavam tinham muito a perder. Depois
de muita discussão chegaram a um consenso. Exu seria o mensageiro de todos eles,
o contato terreno entre os homens e os deuses. Ele gostou, mas ainda perguntou:
- E vou morrer de fome? - Nova discussão. Decidiram então que todos os orixás
que recebessem oferendas entregariam uma parte a ele. Exu saiu satisfeito, agora
sim tinha a importância que merecia, desceu cantarolando e devolvendo pelo
caminho tudo que tinha comido. E a paz voltou a terra, mas ficou o recado: Com
Exu ninguém pode! |
Lenda de Tata Caveira (uma das lendas)
Tatá Caveira é
um exu, ou seja, uma entidade que trabalha na Umbanda, através da incorporação
de médiuns.
Antes de ser uma entidade, Tatá Caveira viveu na terra
física, assim como todos nós. Acreditamos que nasceu em 670 D.C., e viveu até
dezembro de 698, no Egito, ou de acordo com a própria entidade, "Na minha terra
sagrada, na beira do Grande Rio".
Seu nome era Próculo,
de origem Romana, dado em homenagem ao chefe da Guarda Romana naquela
época.
Próculo vivia em uma aldeia, fazendo parte de uma
família bastante humilde. Durante toda sua vida, batalhou para crescer e
acumular riquezas, principalmente na forma de cabras, camelos e terras. Naquela
época, para ter uma mulher era necessário comprá-la do pai ou responsável, e
esta era a motivação que levou Próculo a batalhar tanto pelo crescimento
financeiro.
Próculo viveu de fato
uma grande paixão por uma moça que fora criada junto com ele desde pequeno, como
uma amiga. Porém, sua cautela o fez acumular muita riqueza, pois não queria
correr o risco de ver seu desejo de união recusado pelo pai da moça.
O destino pregou uma peça amarga em Próculo, pois seu
irmão de sangue, sabendo da intenção que Próculo tinha com relação à moça, foi
peça chave de uma traição muito grave. Justamente quando Próculo conseguiu
adquirir mais da metade da aldeia onde viviam, estando assim seguro que ninguém
poderia oferecer maior quantia pela moça, foi apunhalado pelas costas pelo seu
próprio irmão, que comprou-a horas antes. De fato, a moça foi comprada na noite
anterior à manhã que Próculo intencionava concretizar seu pedido.
Ao saber do ocorrido, Próculo ficou extremamente
magoado com seu irmão, porém o respeitou pelo fato ser sangue do seu sangue. Seu
irmão, apesar de mais velho, era muito invejoso e não possuía nem metade da
riqueza que Próculo havia acumulado.
A aldeia de Próculo era rica e próspera, e isto trazia
muita inveja a aldeias vizinhas. Certo dia, uma aldeia próxima, muito maior em
habitantes, porém com menos riquezas, por ser afastada do Rio Nilo, começou a
ter sua atenção voltada para a aldeia de Próculo.
Uma guerra teve início. A aldeia de Próculo foi
invadida repentinamente, e pegou todos os habitantes de surpresa. Estando em
inferioridade numérica, foram todos mortos, restando somente 49
pessoas.
Estes 49 sobreviventes, revoltados, se uniram e
partiram para a vingança, invadindo a aldeia inimiga, onde estavam mulheres e crianças. Muitas pessoas
inocentes foram mortas neste ato de raiva e ódio. No entanto, devido à
inferioridade numérica, logo todos foram cercados e capturados.
Próculo,
assim como seus companheiros, foi queimado vivo. No entanto, a dor maior que
Próculo sentiu "não foi a do fogo, mas a do coração", pela traição que sofreu do
próprio irmão, que agora queimava ao seu lado.
Esta foi a origem dos 49
exus da linha de Caveira, constituída por todos os homens e mulheres que naquele
dia desencarnaram. Entre os exus da linha
de Caveira, existem: Tatá Caveira, João Caveira, Caveirinha, Rosa Caveira, Dr.
Caveira (7 Caveiras), Quebra-Osso, entre muitos outros. Por motivo de respeito,
não será indicado aqui qual exu da linha de Caveira foi o irmão de Tatá enquanto
vivo.
Como entidade, o Chefe-de-falange Tatá Caveira é muito
incompreendido, e tem poucos cavalos. São raros os médiuns que o incorporam,
pois tem fama de bravo e rabugento. No entanto, diversos médiuns incorporam exus
de sua falange.
Tatá é brincalhão, ao
mesmo tempo sério e austero. Quando fala algo, o faz com firmeza e nunca na
dúvida. Tem temperamento inconstante, se apresentando ora alegre, ora nervoso,
ora calmo, ora apressado, por isso é dado por muitos como louco.
No entanto, Tatá Caveira é extremamente leal e amigo,
sendo até um pouco ciumento. Fidelidade é uma de suas características mais
marcantes, por isso mesmo Tatá não perdoa traição e valoriza muito a amizade
verdadeira. Considera a pior das traições a traição de um amigo.
Em muitas literaturas é criticado, e são as poucas as
pessoas que têm a oportunidade de conhecer a fundo Tatá Chefe-de-falange. O
cavalo demora a adquirir confiança e intimidade com este exu, pois é posto a
prova o tempo todo.
No entanto, uma vez
amigo de Tatá Caveira, tem-se um amigo para o resto da vida. Nesta e em outras
evoluções.
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